Os dias passam pálidos e bobos, como uma resposta a mim
mesmo. As horas, distraídas, e enfim do dia o findar. O sol começa a baixar e
as sombras se estender, trazendo junto o pesar.
Um frio se apodera de mim, porém sem trazer sua sensação
térmica, apenas o incontrolável tremor. Um tremor que vem do mais profundo da
minha mente, e nela, um grito desesperado e mudo rasga seu silêncio.
A cada bater do ponteiro um pouco da minha consciência se
esvai, a visão enturvece, perdendo o resplendor de qualquer fagulha de riso. Os
olhos mergulham num redemoinho interno de medo e murcham, como se longos dias
insônitos se abatessem num instante sobre si.
Um estalido no portão e a indicação do ponteiro. É chegado
o momento não esperado. Passos no corredor se debruçam como um manto de
penumbra pela casa e meu coração salta. Eu, quieto em meu quarto acompanho cada
som como com um mapa mental enquanto divago sobre o que está prestes a
acontecer.
Como se já esperasse por esse momento, a porta se abre e
diante de meus olhos se posta toda a representação dos meus medos. Um som
intimidador estoura no ambiente, meu tremor se intensifica e as lágrimas se
seguram na borda dos meus olhos, uma tentativa de manter a sanidade, elas
escorrem de volta para dentro e o choro se derrama invisível a olhos alheios.
As palavras que ouvia ressoavam com minhas cobranças
internas e preenchiam lacunas ainda não ocupadas pelos receios. Meus erros
indesejados e automáticos, mesmo os mais simplórios eram expostos diante de
mim, como se o simples fato de respirar viesse acompanhado de um crime
imperdoável. Uma existência inútil e sem sentido, sem foco ou talento, perdida
e completamente deslocada sentada aos prantos imaginários em sua cama a esperar
a sombra e o som estremecedor passarem.
Largado destruído no vazio do pensamento, os minutos
passavam como noites inteiras de tristeza, à procura de uma resposta para
tantas tentativas de fuga da situação.
Após o silêncio do fechar das portas, meu ser tenta sua
fuga, uma fuga de natureza desesperada, quieta e cabisbaixa, impensavelmente
tateando em busca de uma fagulha de felicidade que anuviasse ou diluísse a névoa
disposta nesse ambiente postado entre o físico e o ideário. Me cerco dos meus
fingimentos, os fragmentos fugazes de felicidade e esqueço de tudo ao redor, o
exterior problemático e caótico para mergulhar no meu momentaneamente acolhedor
e íntimo caos.
Momentos de distração e fuga no fim da noite acompanhados
de um desejo de que o manto da noite fosse contínuo para que aquela curta fuga
não tivesse fim, contra toda a expectativa.
Por fim, a noite se fecha juntamente com meus olhos
exaustos, contra meu desejo e a favor da necessidade para reabrir-se com a luz
apática do recomeçar.
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